Os Protomártires do Brasil
História: Em 16 de junho de 1645, Padre André de
Soveral e outros 70 fiéis foram cruelmente mortos por mais de 200
soldados holandeses e índios potiguares. Os fiéis participavam da missa
dominical, na Capela de Nossa Senhora das Candeias, no Engenho Cunhaú –
no município de Canguaretama, localizado a Zona Agreste do Rio Grande do
Norte. Por seguirem a religião católica, tiveram que pagar com a
própria vida o preço da fé, por causa da intolerância calvinista dos
invasores.
Quatro meses depois, em 03 de Outubro de 1645, aconteceu
outro martírio, onde 80 pessoas foram mortas por holandeses, entre
elas, o Padre Ambrósio Francisco Ferro, que com os fiéis confiados a
si, manteve a firmeza na fé, e o camponês Mateus Moreira, que teve o
coração arrancado pelas costas, enquanto repetia a frase “Louvado seja o
Santíssimo Sacramento”. Este morticínio aconteceu no Engenho de Uruaçu.
Hoje chama-se Comunidade Uruaçu na área do município de São Gonçalo do
Amarante – a 18 km de Natal, litoral do RN.
Processo de Beatificação:
Segundo o Postulador da Causa dos Mártires, Mons. Francisco de Assis
Pereira, “a memória dos servos de Deus sacrificados em Cunhaú e Uruaçu,
em 1645, permaneceu viva na alma do povo potiguar, que os venera como
enclíticos defensores da fé católica”. O processo de beatificação foi
concedido pela Santa Sé, no dia 16 de junho de 1989. Em 21 de dezembro
de 1998, o Papa João II assinou o Decreto reconhecendo o martírio de 30
brasileiros, sendo dois sacerdotes e 28 leigos. Monsenhor Assis
acompanhou o processo de beatificação junto ao Vaticano, por mais de dez
anos, reunindo documentos em pesquisas realizadas em Portugal, Holanda e
no Brasil. Deste material resultou o livro Protomártires do Brasil, de
sua autoria, lançado no final de 1999.
Beatificação aconteceu no Vaticano: A celebração de Beatificação aconteceu na

Praça
de São Pedro, no Vaticano, dia 5 de março de 2000, presidida pelo Santo
Padre João Paulo II. Cerca de mil brasileiros participaram da
celebração. Durante a Santa Missa, João Paulo II pronunciou sua homilia
em italiano, português, polonês, francês e inglês. O Papa fez a seguinte
reflexão em português: “São estes os sentimentos que invadem nossos
corações, ao evocar a significativa lembrança da celebração dos
quinhentos anos da evangelização no Brasil, que acontece este ano.
Naquele imenso País, não foram poucas as dificuldades de implantação
do Evangelho. A presença da igreja foi se afirmando lentamente mediante a
ação missionária de várias ordens e congregações religiosas e de
sacerdotes do clero diocesano. Os mártires, que hoje são beatificados,
saíram, no fim do século XVII, das comunidades de Cunhaú e Uruaçu, do
Rio Grande do Norte. André de Soveral, Ambrósio Francisco Ferro –
presbíteros e 28 companheiros leigos pertencem a esta geração de
mártires que regou o solo pátrio, tornando-o fértil para a geração de
novos cristãos. Eles são as primícias do trabalho missionário, os
protomártires do Brasil. Um deles, Mateus Moreira, estando ainda vivo,
foi-lhe arrancado o coração das costas, mas ele ainda teve forças para
proclamar a sua fé na Eucaristia, dizendo: ‘Louvado seja o Santíssimo
Sacramento'”.
Segundo Postulador da Causa de Beatificação, Mons. Francisco de Assis
Pereira, a data escolhida pela celebração dos Protomártires será 03 de
outubro – data de aniversário do morticínio de Uruaçu. Segundo ele,
provavelmente, a CNBB vai pedir à Santa Sé para estender esta festa para
todo o Brasil, e não somente para a Arquidiocese de Natal.
O termo Protomártires:
Segundo o Mons. Assis Pereira, os mártires de Cunhaú e Uruaçu foram
chamados de Protomártires do Brasil, pelo Prefeito da Congregação das
Causas dos Santos. “Isto porque são os primeiros que derramaram o sangue
pela fé em nossa Pátria, tendo o seu martírio reconhecido oficialmente
pela Igreja”, disse o Monsenhor. Ele foi nomeado pela Conferência
Nacional dos Bispos do Brasil – CNBB – como responsável pela organização
do Martirológio da Igreja no Brasil.
Monumento lembra os Protomártires: Em Uruaçu, local
onde outros mártires tiveram suas vidas barbaramente ceifadas, no
município de São Gonçalo do Amarante – RN, foi construído um monumento
para grandes celebrações e romarias, em parceria com o Governo do
Estado. A inauguração ocorreu aos 02 de dezembro de 2000, com a presença
do Governador do Estado, Garibaldi Alves Filho; do Cardeal Arcebispo do
Rio de Janeiro, Dom Eugênio Sales; do Arcebispo de Natal, Dom Heitor de
Araújo Sales; bispos do Regional Nordeste 2; padres e cerca de 12 mil
fiéis.
Livros publicados sobre o tema: Ao longo dos 363
anos que separam a data do morticínio de Cunhaú e Uruaçu e o atual
momento histórico do Brasil, historiadores, jornalistas e escritores têm
feito referências ao acontecimento. Nos últimos anos, porém, três
livros merecem destaque pela profundidade com que tratam o assunto:
Protomártires do Brasil, do Postulador da Causa dos Mártires junto ao
Vaticano, Monsenhor Francisco de Assis Pereira; Terras de Mártires, da
jornalista Auricéia Antunes de Lima, e Mártires de Cunhaú e Uruaçu, do
Padre Eymard L’E. Monteiro.
Saiba mais sobre os Protomártires do Brasil:
Homilia da Missa de Beatificação celebrada pelo Santo Padre João Paulo II
HOMILIA DO PAPA JOÃO PAULO II
NA MISSA DE BEATIFICAÇÃO DE 44 SERVOS DE
DEUS
Domingo, 5 de Março de 2000
1. "Louvo-te, meu Deus Salvador, glorificando o teu nome
porque... foste o meu apoio e me libertaste" (Eclo 51, 1-2).
Tu, Senhor, foste o meu apoio! Sinto ressoar no coração estas
palavras do Livro de Ben Sirá, enquanto contemplo os prodígios que Deus
realizou na existência destes irmãos e irmãs na fé, que conquistaram a palma
do martírio. Hoje tenho a alegria de os elevar à honra dos altares,
apresentando-os à Igreja e ao mundo como um luminoso testemunho do poder de
Deus na fragilidade da pessoa humana.
Tu, Deus, libertaste-me! Assim proclamam André de Soveral,
Ambrósio Francisco Ferro e 28 Companheiros, Sacerdotes diocesanos, leigos e
leigas; Nicolau Bunkerd Kitbamrung, Sacerdote diocesano; Maria Stella
Adelaide Mardosewicz e 10 coirmãs, Religiosas professas da Congregação da
Sagrada Família de Nazaré; Pedro Calugsod e André de Phú Yên, Leigos
catequistas.
Sim, o Omnipotente foi o seu válido sustento no período da
prova e agora experimentam a alegria da recompensa eterna. Estes dóceis
servos do Evangelho, cujos nomes estão inscritos para sempre no céu, não
obstante tenham vivido em momentos históricos distantes entre si e em
contextos culturais muito diversos, são associados por uma idêntica
experiência de fidelidade a Cristo e à Igreja. O que os une é a mesma e
incondicional confiança no Senhor, e a mesma e profunda paixão pelo
Evangelho.
Louvo-te, meu Deus Salvador! Com a oferta da sua vida pela
causa de Cristo estes novos Beatos, os primeiros do Ano jubilar, proclamam
que Deus é "Pai" (cf. ibid., v. 10), é "protector" e "ajuda" (ibid.,
v. 2); é o nosso Salvador, que acolhe a súplica de quantos confiam n'Ele de
todo o coração (ibid., v. 11).
2. São estes os sentimentos que invadem o nosso coração, ao
evocarmos a significativa lembrança da celebração dos 500 Anos da
Evangelização do Brasil, que acontece neste ano. Naquele imenso País, não
foram poucas as dificuldades de implantação do Evangelho. A presença da
Igreja foi-se afirmando lentamente, mediante a obra missionária de várias
Ordens e Congregações religiosas e de Sacerdotes do clero diocesano. Os
mártires que hoje são beatificados saíram, no fim do século XVII, das
comunidades de Cunhaú e Uruaçu, no Rio Grande do Norte. André de Soveral,
Ambrósio Francisco Ferro, Presbíteros, e 28 Companheiros leigos pertencem a
essa geração de mártires que regou o solo pátrio, tornando-o fértil para a
geração dos novos cristãos. Eles são as primícias do trabalho missionário,
os Protomártires do Brasil. A um deles, Mateus Moreira, estando ainda vivo,
foi-lhe arrancado o coração pelas costas, mas ele ainda teve forças para
proclamar a sua fé na Eucaristia, dizendo: "Louvado seja o Santíssimo
Sacramento".
Hoje, uma vez mais, ressoam aquelas palavras de Cristo,
evocadas no Evangelho: "Não temais aqueles que matam o corpo, mas não podem
matar a alma" (Mt 10, 28). O sangue de católicos indefesos, muitos
deles anónimos crianças, velhos e famílias inteiras servirá de estímulo para
fortalecer a fé das novas gerações de brasileiros, lembrando sobretudo o
valor da família como autêntica e insubstituível formadora da fé e geradora
de valores morais.
3. "Vou louvar para sempre o teu Nome e cantar-te hinos de
agradecimento" (Eclo 51, 10). A vida sacerdotal do Padre Nicolau
Bunkerd Kitbamrung foi um autêntico hino de louvor ao Senhor. Como homem de
oração, o Padre Nicolau sobressaiu da doutrina da fé, na busca de quem
estava desorientado e na caridade para com os pobres. Enquanto procurava
constantemente tornar Cristo conhecido àqueles que nunca ouviram o Seu nome,
o Padre Nicolau enfrentou as dificuldades da missão nas montanhas e na
Birmânia. Todos conheciam o vigor da sua fé, quando ele perdoou as pessoas
que falsamente o acusavam, privando-o da liberdade e causando-lhe mil
sofrimentos. Na prisão, o Padre Nicolau encorajou os seus companheiros de
cela, ensinou o catecismo e administrou os sacramentos. O seu testemunho de
Cristo exemplificou as palavras de São Paulo: "Somos atribulados por todos
os lados, mas não desanimamos; somos postos em extrema dificuldade, mas não
somos vencidos por qualquer obstáculo; somos perseguidos, mas não
abandonados; prostrados por terra, mas não aniquilados. Sem cessar e por
toda a parte levamos no nosso corpo a morte de Jesus, a fim de que também a
vida de Jesus se manifeste no nosso corpo" (2 Cor 4, 8-10). Através
da intercessão do Beato Nicolau, a Igreja na Tailândia seja abençoada e
revigorada no trabalho de evangelização e de serviço.
4. Deus foi verdadeiro "apoio e protecção" também para as
mártires de Nowogródek, a Beata Maria Stella Mardosewicz e 10 coirmãs,
Religiosas professas da Congregação da Sagrada Família de Nazaré. Ele
ajudou-as durante toda a vida e depois no momento da terrível provação,
quando esperaram a morte a noite inteira; foi-o sobretudo ao longo do
caminho rumo ao lugar de execução e, por fim, ao instante do fuzilamento.
Onde é que elas encontraram a força para se entregarem a si
mesmas em troca da salvação dos condenados à prisão de Nowogródek? Onde
hauriram a audácia para aceitar com coragem a condenação a uma morte tão
cruel e injusta? Deus tinha-as preparado lentamente para esse momento da
maior prova. A semente da graça lançada no dia do santo Baptismo e depois
cultivado com grande cuidado e responsabilidade, afundou as raízes e deu o
fruto mais belo, que é o dom da vida. Cristo disse: "Não existe amor maior
do que dar a vida pelos amigos" (Jo 15, 13). Sim, não há amor maior
do que este: estar pronto a dar a vida pelos irmãos.
Agradeço-vos, ó Beatas mártires de Nowogródek, o testemunho do
amor, o exemplo de heroísmo cristão e a confiança na força do Espírito
Santo. "Foi Cristo que vos escolheu e destinou para dardes fruto na vossa
vida e para que o vosso fruto permaneça" (cf. Jo
15, 16). Sois a maior herança da Congregação da Sagrada Família de Nazaré.
Sois a herança da inteira Igreja de Cristo para todos os tempos!
5. "Todo aquele que der testemunho de mim diante dos homens,
também Eu darei testemunho dele perante o meu Pai que está no céu" (Mt
10, 32). Desde a sua infância, Pedro Calugsod declarou-se inabalavelmente em
favor de Cristo e respondeu com generosidade à sua chamada.
Os jovens de hoje podem haurir encorajamento e força do
exemplo de Pedro, cujo amor a Jesus o inspirou a consagrar os anos da sua
juventude à doutrina da fé como leigo catequista. Deixando a família e os
amigos, Pedro aceitou de bom grado o convite que o Padre Diego de San
Vitores lhe propusera, de partir com ele para a missão junto dos Chamorros.
Num espírito de fé, caracterizado pela vigorosa devoção eucarística e
mariana, Pedro assumiu o exigente trabalho que se lhe pedira, enfrentando
com coragem os inumeráveis obstáculos e dificuldades que encontrava. Diante
do perigo iminente, Pedro não abandonou o Padre Diego mas, como um "bom
soldado de Cristo", preferiu morrer ao lado do missionário. Hoje, o Beato
Pedro Calugsod intercede pelos jovens, em particular por aqueles da sua
pátria filipina, enquanto os desafia. Jovens amigos, não hesiteis em seguir
o exemplo de Pedro, que "agradou a Deus, e Deus amou-o" (Sb 4, 10) e,
tendo alcançado a perfeição em tão breve tempo, viveu uma vida plena (cf.
ibid.,
v. 13).
6. "Todo aquele que der testemunho de mim diante dos homens,
também Eu darei testemunho dele perante o meu Pai que está no céu" (Mt
10, 32). André de Phú Yên, no Vietnã, fez suas estas palavras do Senhor com
uma intensidade heróica. Desde o dia em que recebeu o Baptismo, quando tinha
16 anos, dedicou-se ao desenvolvimento de uma profunda vida espiritual. No
meio das dificuldades, às quais se submetem as pessoas que aderem à fé
cristã, viveu como fiel testemunha de Cristo ressuscitado, anunciando
incessantemente o Evangelho aos seus irmãos no seio da associação de
catequistas denominada "Casa de Deus". Por amor ao Senhor, dedicou todas as
forças ao serviço da Igreja, assistindo os sacerdotes na sua missão e
perseverando até à dádiva do próprio sangue, para permanecer fiel ao amor
d'Aquele que se tinha consagrado totalmente. As palavras que repetia, ao
caminhar com decisão ao longo da via do martírio, são a expressão daquilo
que animava toda a sua existência: "Paguemos o amor com o amor ao nosso
Deus, e a vida com a vida".
Hoje o Beato André, Protomártir do Vietnã, é apresentado como
modelo à Igreja do seu País. Todos os discípulos de Cristo encontrem nele a
força e o apoio na provação, tendo o cuidado de confirmar a sua intimidade
com o Senhor, o seu conhecimento do mistério cristão, a sua fidelidade à
Igreja e o seu sentido de missão!
7. "Não tenhais medo!" (Mt 10, 31). Este é o convite de
Cristo. Esta é também a exortação dos novos Beatos, que permaneceram firmes
no seu amor a Deus e aos irmãos inclusive no meio das provas. O convite
apresenta-se-nos como um encorajamento no Ano jubilar, tempo de conversão e
de profunda renovação espiritual. Não nos atemorizem as provações e as
dificuldades; não nos desanimem os obstáculos ao fazermos opções corajosas e
coerentes com o Evangelho!
O que podemos temer, se Cristo está connosco? Por que duvidar,
se permanecemos ao lado de Cristo e assumimos o compromisso e a
responsabilidade de ser seus discípulos? A celebração do Jubileu nos
consolide nesta decidida vontade de seguir o Evangelho. Os novos Beatos
servem-nos de exemplo e oferecem-nos a sua ajuda.
Maria, Rainha dos Mártires, que aos pés da Cruz compartilhou
até ao fim o sacrifício do Filho, nos sustenha no corajoso testemunho da fé!